Como ter funcionário mais produtivos concedendo pausas no trabalho?
Nessa Era tecnológica, cada segundo faz uma enorme diferença para a produção em cadeia global. Diante a necessidade de exploração do máximo de tempo produtivo, portanto, estabeleceram-se sistemas de jornadas, turnos ininterruptos, escalas diferenciadas de trabalho, sempre com o fito de produzir mais e melhor.
Doutro lado, a produção contínua que no olhar macro demonstra-se como elemento de vasta competitividade, já que todos desfrutam da mesma quantidade de tempo, por outro lado, em médio e longo prazo pode afetar a saúde dos trabalhadores.
Por isso nesse breve artigo será abordada, sem pretensão alguma de esgotamento do tema, aspectos relevantes acerca da jornada de trabalho com ênfase aos tipos de intervalos e pausas previstas em lei e as suas consequentes vantagens para a organização e toda sociedade.
Palavras-chaves: direito do trabalho; jornada de trabalho; produtividade; intervalo; saúde do trabalhador; lucro.
Abordagem sintética da jornada de trabalho
É de conhecimento da grande maioria que, antes da Era Industrial não havia qualquer regulamentação acerca da duração do trabalho, isto é, não havia qualquer limite de jornada.
Os primeiros regramentos disciplinando essa seara surgiram isoladamente, segundo ensina a saudosa jurista Alice Monteiro de Barros:
“a historia registra um ato normativo isolado, conhecido como Lei das Índias (1593), que vigorou na Espanha, dispondo que a jornada não poderia ultrapassar oito horas diárias. Na Inglaterra, a a primeira lei limitou a jornada em 10 horas (1847) e na França estabeleceu-se o mesmo limite em 1848, para os que trabalhavam em Paris. Nos EUA, já em 1868 fixava-se em oito horas a jornada para empregados federais. Na América Latina, o Chile foi o primeiro a estabelecer esse limite para os trabalhadores estatais (1908) (...) No Brasil, há notícia de um Decreto de 1891 que vigorou no Distrito Federal, dispondo que a jornada dos meninos era de nove horas e das meninas, de oito horas (...)”.
A Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988, fixou a jornada de trabalho de 08 (oito) horas diárias para homens e mulheres, fixando o limite semanal de 44 (quarenta e quatro) horas e estabelecendo o adicional de 50% (cinquenta por cento) no caso de horas extras, vide Art. 7º, inciso XIII:
XIII - duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho; (Vide Decreto-Lei nº 5.452, de 1943)
A Carta Magna vigente também cuidou de estabelecer a jornada laboral no caso de turnos interruptos de revezamento, limitando-as a 06 (seis) horas:
XIV - jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva;
Há de se salientar que a finalidade precípua da limitação da jornada de trabalho não é outra senão a tutela da integridade física do trabalhador.
Aqui já se consegue extrair, pelo menos 03 (três) fundamentos que justificam e amparam a regulamentação da jornada: (i) de cunho fisiológico, (ii) econômico, o que interessa especialmente quando se trata de produtividade. E também tem cunho (iii) de ordem social, já que permite ao trabalhador que desfrute de lazer, convívio com a família, etc.
Ultimamente, sobrevieram algumas modificações na contextualização da jornada. Verdadeiramente, houve uma relativização da jornada de trabalho, admitindo-se que, algumas escalas sobrepujem o limite mínimo constitucionalmente assegurado, em caráter excepcional.
Além disso, houve modificações substanciais no cômputo da jornada de trabalho em si. Como por exemplo, a mudança de situações que outrora poderiam configurar como tempo à disposição, como a disciplina acerca da permanência do empregado nas instalações da empresa após o expediente de trabalho sem que haja configuração do tempo à disposição do empregador; o fim da obrigatoriedade de pagamento das horas de percurso, também denominada como horas “in itinere”; bem como, no modo de compensação, prorrogação das jornadas e a possibilidade de formalização de banco de horas individual; além da regulamentação legal da escala 12x36 e o estabelecimento do valor mínimo para remuneração das horas extraordinárias e a redução do intervalo intrajornada.
A Lei nº 13.467/2017 (Lei da Reforma Trabalhista) foi responsável por parte considerável das mudanças da jornada laboral da atualidade no Brasil. Estabelecendo nova ordem jurídica na regulação da duração do trabalho, que ao mesmo tempo possibilitou a ampliação de novas jornadas de trabalho, revogou algumas situações protegidas, como o intervalo da mulher (Art. 384, CLT).
E ainda permitiu a livre estipulação de cláusulas contratuais que tratem da duração de trabalho, observados os limites constitucionais, especialmente para os trabalhadores que se enquadrem na categoria hiperssuficientes (com diploma de nível superior e com remuneração maior ou igual a 02 (dois) maiores salários de contribuição do INSS).
Aos demais empregados, permitiu-se a negociação coletiva com a garantia de aplicação do negociado sobre o legislado, isto é, a previsão da norma coletiva, via de regra sobrepõe ao que diz a lei acerca daquela jornada.
O fato é que independentemente da jornada ativada, o trabalhador faz jus aos intervalos (intrajornada e interjonada) e algumas pausas, no caso de atividades especificas, para descanso e alimentação, como se verá a seguir.
Principais tipos de intervalos previstos em lei
Para fins de concessão de intervalo cuidou o legislador de estabelecer pelo menos 03 (três) marcos temporais para a observância do intervalo intrajornada: (i) Jornadas até 04 (quatro) horas de trabalho, não há obrigatoriedade de concessão de intervalo; (ii) Jornadas de 04 (quatro) a 06 (seis) horas o intervalo deverá ser de até 15 (quinze) minutos; (iii) Jornadas superiores a 06 (seis) horas deverá ser concedido um intervalo para refeição e descanso de 01 (uma) até 02 (duas) horas.
Veja o que dispõe o “caput” e §1º do Art. 71 da CLT:
Art. 71 - Em qualquer trabalho contínuo, cuja duração exceda de 6 (seis) horas, é obrigatória a concessão de um intervalo para repouso ou alimentação, o qual será, no mínimo, de 1 (uma) hora e, salvo acordo escrito ou contrato coletivo em contrário, não poderá exceder de 2 (duas) horas.
§ 1º - Não excedendo de 6 (seis) horas o trabalho, será, entretanto, obrigatório um intervalo de 15 (quinze) minutos quando a duração ultrapassar 4 (quatro) horas.
Esses intervalos não são computados na duração do trabalho.
Segundo ensina o Professor e Desembargador do Trabalho em São Paulo Sérgio Pinto Martins, os intervalos para descanso são períodos na jornada de trabalho, ou entre uma e outra, em que o empregado não presta serviços, seja para alimentar ou descansar (MARTINS, 2017, 820p.)
Por ser de natureza de ordem pública que não pode ser desrespeitado, sob pena de sanção administrativa, bem como obrigação a remunerar o intervalo não concedido enriquecido de 50% (cinquenta por cento).
Afinal de contas, “(...) não gozando o empregado o período mínimo necessário para recompor suas energias, deve o empregador remunerar, como extras”, conforme entendimento do C, Tribunal Superior do Trabalho. (TST - AIRR e RR: 7806409320055090002 780640-93.2005.5.09.0002, Relator: Ives Gandra Martins Filho, Data de Julgamento: 12/09/2007, 4ª Turma). Nesse sentido, a Lei 13.467 de 2017, estabeleceu que se o intervalo intrajornada não for concedido na integralidade, como determina a lei, a empresa deverá remunerar o tempo suprimido acrescido de 50% (cinquenta por cento).
Nada obstante, a despeito da previsão legal no sentido a “não concessão ou a concessão parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, a empregados urbanos e rurais, implica o pagamento, de natureza indenizatória, apenas do período suprimido, com acréscimo de 50% (cinquenta por cento) sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho”. Desse modo, como ensina Eduardo Carrion, fica cancelada a Súmula do TST, 437, que disciplinava acerca da não-concessão ou a concessão parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, a empregados urbanos e rurais, implica o pagamento total do período correspondente.
Há profissões em que se permite o fracionamento do intervalo ante a natureza do serviço e em virtude das condições especiais de trabalho tais como os motoristas, cobradores, fiscalização de campo e afins nos serviços de operação de veículos rodoviários, empregados no setor de transporte coletivo de passageiros, desde que mantida a remuneração e concedidos intervalos para descanso menores ao final de cada viagem.
Caso a jornada seja de apenas 06 (seis) horas, mas seja elastecida habitualmente, passa a ser devido o gozo do intervalo intrajornada mínimo de uma hora, obrigando o empregador a remunerar o período para descanso e alimentação não usufruído como extra, acrescido do respectivo adicional, na forma prevista no art. 71, caput e § 4º da CLT (Item, IV, Súmula nº 437, TST).
Além do intervalo intrajornada os empregados devem usufruir de intervalo mínimo entre uma jornada e outra de 11 (onze) horas consecutivas de descanso (art. 66 da CLT). A inobservância desse direito, de igual modo, acarreta sanção administrativa, bem como implica no reconhecimento ao pagamento desse período como hora extraordinária.
Nesse sentido, aplica-se a Súmula nº 110 do TST:
JORNADA DE TRABALHO. INTERVALO (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003 No regime de revezamento, as horas trabalhadas em seguida ao repouso semanal de 24 horas, com prejuízo do intervalo mínimo de 11 horas consecutivas para descanso entre jornadas, devem ser remuneradas como extraordinárias, inclusive com o respectivo adicional.
No caso de atividade é ininterrupta, deve haver, igualmente a concessão dos intervalos obrigatorios, o que nao descaracteriza os turnos ininterruptos de revezamento (Súmula nº. 360 do TST).
Ademais, há algumas profissões que dada as suas especificidades exigem intervalos diferenciados, como por exemplo, o oficio de mecanografia (datilografia, escrituração ou cálculo), a cada período de 90 (noventa) minutos de trabalho consecutivo corresponderá um repouso de 10 (dez) minutos.
A mulher lactante também possui intervalos diferenciados. Além do intervalo intrajornada mínimo de 1(uma) hora, possui o direito, durante a jornada de trabalho, a 2 (dois) descansos especiais de meia hora cada um, destinados ao aleitamento materno, durante o prazo de 6 (seis) meses não é absoluto, de modo que, quando o exigir a saúde do filho, esse período poderá ser dilatado, a critério da autoridade competente, mediante acordo individual entre a mulher e o empregador.
Finalmente, imperioso pontuar qu os intervalos concedidos pelo empregador não previstos em lei correspondem tempo à disposição da empresa, logo devem ser remunerados como serviço extraordinário, se acrescidos ao final da jornada (Súmula 118 do TST).
Produtividade x Descanso
Com efeito, não se pode desprezar que o cenário atual esta marcado de mudanças no ambiente organizacional, repercutindo diretamente no bem-estar do trabalhador. Isso faz com que as organizações tenham que adotar politicas e estratégias que aumentem a produtividade, mas que também valorize o trabalhador.
O legislador já cuidou de estabelecer parâmetros mínimos de duração de jornada e a consequente imposição de intervalos durante a jornada e entre ela, com fito de preservação da integridade, higiene e descanso do trabalhador.
Como dito alhures essas pausas e descansos obrigatórios não eliminam outros dentro da jornada, como por exemplo: pausas para tomar água, ir ao banheiro as quais não podem ser limitadas pelo empregador.
Em que pese possa parecer antagônica associação do descanso com a produtividade, quando se falar em saúde do trabalhador e aqui cabe uma observação acerca do teor do artigo 611-B, paragrafo único da CLT que trouxe consigo a seguinte disposição:
Parágrafo único. Regras sobre duração do trabalho e intervalos não são consideradas como normas de saúde, higiene e segurança do trabalho para os fins do disposto neste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017)
Como se aquilata do dispositivo invocado, apenas e tão somente para fins de negociação coletiva, os temas afetos a duração e intervalo de trabalho não são considerados como normas de saúde, higiene e segurança do trabalho, haja a vista a proibição de haver negociação acerca dessa temática (inciso XVII, do Art. 611-B).
Isso significa que, a jornada laboral esta sim totalmente relacionada a saúde do trabalhador. Tanto é verdade que há diversos distúrbios relacionados a esta seara, tais como transtornos diversos e a Síndrome de Burnout ou Síndrome do Esgotamento Profissional, que acarreta danos severos aos empregados e em contrapartida oneram demasiamente as empresas com a fixação de indenizações elevadas para reparação dos danos sofridos pelo trabalhador.
Não é a toa que algumas empresas tornaram-se adeptas da modernização de suas instalações, além de flexibilizar a jornada de trabalho, melhorando consideravelmente o engajamento do pessoal, a qualidade do trabalho e a produtividade.
Conclusão
Dado ao exposto, forçoso concluir que a empresas devem observar e conceder adequadamente os intervalos legais, para evitar formação de um passivo trabalhista. Nada obstante, se quiser colaboradores mais engajados, comprometidos e produtivos precisam se atentar e se inteirar acerca dos modelos de jornadas flexíveis, por exemplo, sempre observando e primando sempre pela saúde e segurança do trabalhador.
E não é necessário grandes investimentos, despesas ou custos. Em muitos casos a mera observância das pausas no trabalho já asseguram um aumento da produtividade e consequente lucratividade da empresa.
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